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Capitulo IX - Do modo com que se hão de tirar as Cartas dos portos, e costas marítimas

De Atlas Digital da América Lusa

Capitulo IX - Do modo com que se hão de tirar as Cartas dos portos, e costas marítimas

Geometria

Do modo com que se hão de tirar as Cartas dos portos, e costas marítimas

As cartas dos portos, e costas marítimas pedem uma grande exacção[SIC][exatidão?]ou[exação?],e particular cuidado, para que sejam ajustadas, e verdadeiras; porque delas depende muitas vezes o salvarem-se, ou perderem-se os navios, e a gente, que neles anda embarcada

A primeira coisa, que deve fazer [165] ... o Engenheiro, é certificar-se de todos os pontos eminentes, que se acham em terra ao longo da costa, e que servem de baliza aos navios, para que se não erre na Carta nenhum destes pontos; para o que será necessário que se informe dos Marinheiros, e Pescadores mais práticos na navegação daquela costa; para que estes lhe digam quais são os finais em terra, de que se servem, para evitar os rochedos cobertos, e os bancos ou restingas da arca; por quanto os escolhos mais consideráveis tem ordinariamente em terra dois pontos, ou finais, cujo alinhamento se termina no mesmo escolho. Quando o terreno não tem estas balizas naturais, se lhe fazem artificiais, como os tem algumas barras deste reino: estas balizas se podem fazer de madeira; mas o mais ordinário [166] ... é fazerem-se de pedra, e cal em forma de coluna, Torre, ou arcada e quando a terra lhe serve de fundo, se mandam caiar para se distinguirem melhor: mas aquelas balizas, a que o ar serve de fundo, se devem tingir de negro; porque assim se vem mais distintamente, do que sendo caiadas.

Estes finais em terra se devem tomar com a Prancheta guarnecida de óculos, dimensório do modo que fica dito nos Capítulos II. e IV. e da mesma sorte se tomarão as posições dos rochedos, que estão a vista dentro da água.

Para os rochedos, que não aparecem, e para os bancos de área, ou restingas, será necessário mandar um batel com um pavilhão ou bandeirola no mastro, e estando o batel na situação do rochedo, ou [167] ... banco de área, deitara fatexa[SIC]?, e fará final, para que os que estão na terra com os instrumentos, possam tomar os pontos com presteza, dirigindo o instrumento para aquela parte ao mesmo tempo que se lhe faz o final: se o batel não pode deitar fatexa[SIC], ou por muita altura de água, ou por não ser o fundo capaz, os remadores sustentarão o batel contra a corrente das águas, e farão final, e tudo isto se faz, obrigando a necessidade: se forem muitos os bancos, ou escolhos, que se possam tomar de um mesmo ponto de terra, será necessário mandar outros tantos bateis com suas bandeirolas.

Se houver alguma Ilha rasa, e calva, que não tenha final algum, nos seus extremos se mandarão por duas bandeirolas, e se lhe tomarão somente esses pontos; porque o mais [168] ... do seu contorno se acabara de tirar com a Bussola, ou por meio de algumas diagonais, se a Ilha for pequena.

Tomados assim todos os pontos do mar, e da terra, e retificados uns por outros, está feito o principal da Carta, e tudo o mais é fácil de tirar com a Bussola, que é para isso o mais próprio instrumento, como fica dito; e se a Carta Geográfica não é para servir aos navegantes, pode-se dar por acabada, feita a configuração da costa com a Bussola, e desta sorte basta que se tirem as Cartas dos Bispados, em que houver costas marítimas nas que hão de servir a História de Portugal.

Porém, se as Cartas forem feitas para o uso dos navegantes, ainda lhe falta muito para sua perfeição: porque é de grande conseqüência [169] ... saber a altura das águas junto das praias, e altura, que tem sobre os rochedos; de que parte vão, ou vem as correntes, e de quanto levantam, ou abaixam as águas com os mares; porque tudo isto se deve notar nas Cartas.

As marés, ou fluxo, e refluxo do mar e uma certa elevação das águas, que depois de subir em um certo espaço de tempo, torna outra vez a abaixar; e por isso se chama fluxo, e refluxo.

Este fluxo tem seus períodos de todos os dias, de todos os meses, e de todos os anos. O período diurno, ou de todos os dias consiste em que todos os dias duas vezes as águas levantam, e abaixam; e este movimento segue sempre o movimente da Lua; porque quando a Lua chega ao circulo das seis horas, o mar começa a subir, e faz preamar [170] ... precisamente quando este Astro chega ao Meridiano: e como a Lua retarda todos os dias 48. minutos, as águas retardam também: isto se entende nas costas livres, ou mar largo; porque aonde as águas correm constrangidas, e apertadas, o mar cresce ainda depois que a Lua tem passado o Meridiano, e não principia também o seu movimento, que depois de estar debaixo do círculo das seis horas: e assim ainda que a regra seja geral nos lugares livres, nas costas marítimas recebe muita variedade, porque a maré causa correntes, e transportes de água de uns lugares a outros, de que resulta ser preamar mais cedo, ou mais tarde em uns portos, do que em outros, ainda que pouco distantes, em que só pode servir de regra a experiência.

[171] O segundo período é de todos os meses, por se ter observado que as marés são maiores nos novilúnios, e vão diminuindo até o quarto crescente, e daí vão crescendo até a Lua cheia, tempo em que ordinariamente são mais altas que nos novilúnios, ainda que estas sucedem ser maiores por causa dos ventos: as marés dos 3 ou 4 dias antes, e depois dos novilúnios, e plenilúnios se chamam águas vivas, e nos outros quartos de Lua se chamam águas mortas, em cujo tempo, ainda que as águas sobem pouco, sempre gastam o mesmo tempo a subir, e descer, que quando são águas vivas.

O terceiro período das marés é de um ano, porque se tem observado que as marés as mias próximas dos Equinócios são as maiores de todo o ano.

[172] Esta digressão das marés servirá para dar uma ideia de utilidade, que se segue de serem as cartas marítimas feitas de sorte, que possam mostrar aos navegantes todos os finais necessários para evitarem o perigo de se perderem por falta de conhecimento; e assim para fazer uma carta de costas marítimas completa, depois de feita, e signalada a meridiana, e as paralelas, e postas nos lugares convenientes algumas Bussolas, ou rosas do rumo dos ventos: será necessário signalar a altura das águas, a que chamam sondas, que se tomaram, como logo diremos, e além disso é necessário a juntar uma memória, ou explicação, que compreenda as coisas seguintes.

I. A que hora é preamar dos dias dos plenilúnios, e novilúnios sobre aquela costa, de que se tira a Carta II. [173] A que altura sobem as águas ao ordinário, e nas maiores mares dos Equinócios. 3. Se há correntes, e para que parte, por quanto a figura das costas marítimas determina as correntes para uma, ou para outra parte, e além disso sucede haver correntes particulares, a roda de alguns rochedos, ou pequenas Ilhas, e há algumas que levam as embarcações a terra, ou sobre os rochedos; e outras, que quando o mar corre a Lesta, a mesma porção de água retrocede de Oeste, e é preciso notar tudo. 4. Quais são os finais em terra, que servem de balizas para evitar algum rochedo coberto de água: e para maior clareza se poderá notar, lançando na Carta uma linha vermelha de baliza ao rochedo. 5. A altura das marés na baixamar, e finalmente a qualidade dos fundos.

[174] ... , ou ancoradoiros[SIC], se é rochedo, terra mole ou dura; área miúda, ou grossa, vermelha, negra, ou parda, o que se conhece por meio da sonda, como logo diremos; porque daí se infere se o surgidouro[SIC] é bom, ou mao[SIC].

Para todas estas clarezas é necessário examinar tudo com uma sonda, que é ordinariamente de chumbo em figura de pirâmide sextavada, ou oitavada: a base deve ter um côncavo, e a pirâmide surada de alto a baixo, e de um palmo e meio de comprido, ou ainda maior para grandes alturas, e para onde é grandes correntes.

Esta se enfia em um cordel dividido em braças com alguns finais; porque a altura das águas se conta por braças, advertindo que as braças marítimas tem só oito palmos (segundo o estilo deste Reino) entre [175] ... os Marinheiros: quando á água é pouca, se conta por palmos, o que se deve notar nas Cartas no lugar da explicação.

No côncavo da base da pirâmide, além do nó do cordel, se acaba de encher de cedo, o que serve para conhecer se o fundo é pedra, terra, ou área, ou qualquer outra casta.

Quando se sabe pouco mais, ou menos a altura de água, se desembrulha o cordel a proporção, e se deita o plumo, ou pirâmide o mais longe que for possível aonde há correntes, para que ainda venha a ficar a plumo do lugar, em que se deita; porque descendo descreve uma lista; porque descendo descreve uma linha composta de dois movimentos, um do seu próprio peso, que o faz descer, e outro da corrente, que o leva consigo em quanto desce: a corda se vai largando [176] ... até que se sente que o plumo toca o fundo, e logo se vai retirando, e contando as braças signaladas no cordel, e se escreve o numero no borrador, para depois se notar na carta : estas sondas se não hão de fazer arbitrariamente, mas é necessário ter alinhamentos em terra para dirigir sobre o papel algumas linhas ocultas, e é necessário fazer memória distinta no borrador por exemplo.

Memória para os alinhamentos das sondas de tal costa, ou de tal porto, de tal enseada, etc.

Algumas das distancias da praia ao lugar, em que se deita a sonda, que não tem alinhamentos a terra, não é fácil determinar-se na Carta a sua justa posição.

Alguns regulam estas distancias, contando as vezes que os remos molham na água, e outros fazem esta [177] ... operação com dois batels[SIC], um fica dado fatexa[SIC] ou satexa[SIC], e outro, que parte levando um cordel de um certo numero de braças, para saber a distancia de um a outro; mas de qualquer modo que seja, sempre é necessário recorrer a estimação, que depende da experiência, e bom juízo prudencial, para julgar das correntes, e do que a maré vai abaixando, ou levantando em quanto se tomam as sondas.

A roda das Ilhas, das barras, e surgidouros, é necessário tomar as sondas mais miúdas, e com maior exacção[SIC], principalmente quando é necessário que as embarcações sigam algum canal, que é como uma cava, que faz a água no fundo, por onde corre com maior velocidade.

O mais seguro é do lugar donde se sonda, observar sempre na terra [178] ... alguns finais, que lhe correspondem, e tomar as distancias por estimação quando da terra não pode haver alinhamentos para elas.

Os rochedos cobertos de água, e as restingas de pedras, ou de área, são fáceis de conhecer; porque o mar quebra neles, e faz escuma, ainda quando está pacífico, e nem sempre se pode ir acima dos tais rochedos; porque o mar repele os bateis, e se levanta de sorte, que os pode submergir.

Quando se houver de tirar alguma Carta de costa, Ilha, ou porto de mar, o que se deve fazer, é ajuntar os pescadores para saber deles os nomes de todos os sítios, e rochedos: porque são os que os conhecem todos; e é necessário acomodar-se a sua rustiques[SIC] para os poder entender e pergunta-lhos ao seu modo.

[179] Para transferir as operações ao papel se põem primeiro em seu lugar as posições das costa, pelo que toca a terra, e a mesma costa com todas as suas tortuosidades, fazendo o terreno ao ordinário, como dissemos no uso da Prancheta, e Bussola: e logo se fará uma linha da cor da água, que denota o lugar, onde chegam as águas na preamar, e outra linha pontuada, que denota a baixamar; e a cor da água nestas linhas deve ser alguma coisa mais forte que no resto do mar, que deve ser coberto de uma aguada mais clara, exceto sobre alguns rochedos, ou partes, em que o mar quebra, ou, como dizem, arrebenta; porque para os notar além do final se dão algumas pinceladas miúdas de aguada mais forte.

As restingas, ou bancos de área se notam com pontinhos miúdos: os rochedos [180] ... que nunca se descobrem, costumam alguns notar com uma Cruz dos dois braços, e os que se cobrem, e descobrem com as mares, com uma Cruz simples; porém os que sempre estão descobertos se lavam de cor de pedra, e algum vermelho: os lugares, em que há bons surgidouros[SIC], e é necessário que estes, e outros finais, de que usarem, se expliquem na Carta; ( como há estilo) e estas explicações se põem sempre nas partes, em que não embaraçam, ou encobrem coisa necessária. O Ordinário é porem-se nas partes confinantes, e nos mesmos lugares se costumam por os petipés.

[181]




Ficha técnica da Fonte
Autor: Manuel de Azevedo Fortes
Data: 1722.
Referência: ..
Acervo: Biblioteca Nacional de Portugal.
Transcrição: Carlos Antonio Pereira de Carvalho.
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