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Capitulo I - Do Petipé, e das mais coisas necessárias para fazer as Plantas, ou Cartas Geográficas

De Atlas Digital da América Lusa

Do Petipé, e das mais coisas necessárias para fazer as Plantas, ou Cartas Geográficas.

O Petipé é uma linha arbitrária, dividida em um certo numero de partes iguais, que denotam indiferentemente quaisquer medidas, ou sejam léguas, ou braças, varas, pés, palmos, etc.

A medida mais ordinária entre os Engenheiros Portugueses é o Pé Português, que tem palmo e meio de craveira, e é alguma coisa maior que o pé geométrico, e que o pé régio de França: mas por ser mui pouca a diferença, se pode desprezar.[3] ... E só se deve atender se se houverem de reduzir umas medidas em outras, como adiante diremos.

Exemplo de um Petipe

O pé se divide em doze polegadas, das quais oito fazem parte o nosso palmo de craveira: cada polegada se divide em dez partes mais miúdas, a que uns chamam linhas, outros chamam pontos: nas Cartas Geográficas, e nas plantas é escusada mais miúda divisão

A braça Portuguesa tem seis pés, e dois terços, ou dez palmos: a braça de França chamada Toeza tem seis pés régios, ou nove palmos de craveira escassos.

Um passo comum não tem certa, e determinada medida: e ordinariamente tomado por três pés, ou quatro palmos e meio.

Um passo andante ordinário também não tem determinada medida; mas é tomado mais ordinariamente [4] ... por dois pés, ou três palmos.

O passo geométrico é medida determinada, e contem cinco pés geométricos, ou sete palmos e meios de craveira escassos.

As léguas ordinariamente se contam por passos geométricos; mas como as léguas são diferentes em diferentes partes; porque em Alemanha quinze léguas na terra correspondem a um grão da Esfera: em França lhe correspondem vinte léguas: em Portugal dezessete e meia, ou dezoito; será necessário convir de uma certa distancia para notar uma légua; para o que me parece andam mais ajustados aqueles, que regulam a légua por uma hora de caminho a passo cheio, e ordinário, dando a cada légua três mil passos geométricos; e mil passos destes fazem a milha Italiana, [5] ... e sessenta milhas correspondem a um grão de Esfera.

Pelas observações dos Matemáticos de Paris feitas com maior exacção[exatidão], e com os mais ajustados instrumentos se achou que cada grão do circulo máximo da Esfera correspondia na terra a 342360 Pés régios de França, que fazem distancia de vinte léguas nas Cartas Francesas; e porque os pés Portugueses (como fica dito) são alguma coisa maiores, do que os pés régios de forte, que 80 Pés Portugueses fazem 81. Pés régios, e cada 27 Pés régios fazem 40. Palmos de craveira, por cada um grão de Esfera nos correspondem 507200 Palmos craveiros, ou palmos de vara Portuguesa: é dando 18. Léguas por cada grão do circulo máximo da Esfera, (ajustando-nos com o Roteiro da navegação... [6] ... a respeito das costas marítimas) daremos a cada légua Portuguesa 28178 palmos craveiros, ou 2818 Braças de dez palmos cada uma.

Nas Cameras[sic] dos Estados do Brasil se tem introduzido dar a cada légua 3000. Braças de distancia, e por esta conta correspondem a um grão da Esfera 17. Léguas escassas.

É necessário fazer os Petipés de forte, que constem de partes alíquotas quanto puder ser: por exemplo, se o petipé for de 1000 Braças, se dividirá o comprimento da linha em dez partes iguais, e se tornara a dividir a primeira porção de 100 Braças em quatro partes iguais, e cada uma valerá 25 Braças e porque o numero 25 é divisível por cinco, se dividirá a primeira [7] ... parte em cinto partes iguais, e valerá cada uma cinco braças, etc. Será livre a cada um fazer os petipés para as plantas do modo, e com divisões, que melhor entender: porém para as Cartas Geográficas, que hão de servir a Historia de Portugal, é preciso que os Engenheiros, que as houverem de fazer, usem todos de um mesmo petipé dividido em braças,ou varas, se melhor parecer

Para outras quaisquer plantas, ou Cartas, como o petipé depende ordinariamente da grandeza, que se quer fazer a planta, ou Carta, apontar-se aqui as medidas, que me parecem as mais proporcionadas, segundo as diferentes grandezas dos terrenos.

O menor ponto, em que se pode fazer a Carta de um Reino, é de dez léguas por cada polegada de [8] ... papel, sendo por exemplo como o reino de Portugal, e Algarves, e sai a légua por linhas, e com semelhante petipé Cidades, e Vilas; e o menor ponto, em que se podem fazer as províncias, e duas léguas por cada polegada de papel e assim se poderão notar os principais lugares com suficiente distinção.

As plantas das praças com o terreno à roda em distancia de artilharia, se podem reduzir a 100 Braças por cada polegada de papel; porque com esta proporção se podem distinguir todas as partes de uma Fortificação, e tudo o que contém dentro dos seus muros: mas se quiserem regular o petipé a 75 Ou 50 Braças por cada polegada de papel. [9] Para fazer a planta de uma praça de forte, que no seu petipé se possa expressar até a grandeza de um palmo, e que se lhe conheçam as grossuras, e escarpas, se lhe pode dar por cada trinta braças uma polegada de papel, que sai a três braças por linha; porque desta forte a maior Praça feita por semelhante petipé será quanto pode ser distinta, e se lhe poderão notar qualquer miudezas, e diferenças; e não ocupara mais que quatro até cinco palmos de papel, que não é grandeza desproporcionada.

Para os edifícios, como Armazéns, Quartéis, Cazernas, Corpos de guarda e etc., as plantas, e perfiz se podem reduzir braças por cada polegada de papel, para que se possam notar distintamente [10] ... todas as medidas.

Este mesmo petipé de duas braças por polegada deve servir para a planta de qualquer parte da fortificação, como baluarte, revelim, meia lua, etc., quando se lhe tirar a planta à parte; o que sempre se deve praticar, fazendo plantas separadas com maior ponto de todas as partes de uma fortificação ou seja para se repararem, ou para se fazerem de novo.

Estas regras só servem para dar uma ideia dos petipés, com que se devem fazer as plantas: podem porém estas regras ter várias exceções; porque muitas vezes é necessário acomodar-se ao tamanho do papel, a que se quer reduzir a planta, ou Carta; o que depende do juízo prudencial do Engenheiro, e do fim, para que se fazem as plantas: poderem os petipés feitos.[11]... feitos nas proporções apontadas se acham conformes com as Cartas e plantas exatas, que tenho visto, assim gerais como particulares, feitas pelos melhores Engenheiros dos Reinos do Norte.

Isto suposto, como determinamos fazer a medição das Cartas geográficas da Historia de Portugal por braças; e segundo as melhores observações atentamos dar a cada légua portuguesa 2818. Braças; nos petipés que se houverem de fazer para elas, usarão dos os engenheiro desta medida nas cartas dos Bispados, e prelazias; e por cada 2818. Braças tomaram uma polegada das oito, que contem o palmo e assim uma polegada quadrada do papel Dara na Carta uma légua quadrada de terreno, e dividindo cada polegada em dez linhas, a cada linha ou décima [12] ... décima parte de uma polegada corresponderam aproximadamente 282. Braças : sendo as cartas geográficas feitas por semelhante petipé, se poderão notar nelas todas as paróquias, de que se compõem qualquer Bispado, ou Prelazia.

Nesta forma se farão os petipés das Cartas, que hão de servir a Historia de Portugal, e por este modo todos os Engenheiros ocupados na fabrica delas terão sem diferença o mesmo petipé; porque o palmo de craveira Portuguesa é o mesmo em todo o Reino, por ser o palmo da vara commua [sic] de medir: porém ao fazer as Cartas poderão no borrador tomar o dobro, ou o triplo deste petipé, para mais facilmente poderem notar algumas coisas mais precisas da configuração dos terrenos, como montes, rios com suas voltas e cotovelos. [13] ... lagos, matos, etc.

Um só Engenheiro com um, ou dois medidores poderá muito bem tirar a planta de uma praça, ou fazer a carta particular de uma pequena extensão de terreno: mas para a factura da Carta Geográfica de uma província, ou bispado, sempre o Engenheiro Diretor necessita ao menos de outro subalterno, que o ajude nas operações; e se forem dois, ou mais subalternos, ainda darão maior expedição.

Devem os Engenheiros levar consigo o petipé gravado em uma régua de latão, ou madeira de buxo, e nela o petipé posto em tres, ou quatro linhas paralelas; para que quando se gastarem os pontos de uma, se possam servir de outra. O mesmo petipé se pode fazer em pergaminho, e será bom levar dois destes. [14] ... petipés, por que pode suceder perder-se na campanha, e em parte, aonde não seja fácil fazer outro.

Devem também levar consigo um instrumento de medir distancias.

Entre os instrumentos de medir distancias, os mais principais são os ''Semicírculo'', ou ''Circulo dimensório'': a ''Prancheta'', e a ''Bussola'', dos quais daremos o uso nos Capítulos seguintes. É necessário que o Engenheiro, que houver de fazer uma Carta Geográfica, leve consigo um destes instrumentos, e ao menos duas, ou três pessoas, que saibam medir, e só os poderá escusar, se houver de tirar a planta de alguma Praça; por que nas Praças se acham ordinariamente Oficiais, que trabalham nas obras de Fortificação, ou soldados, a quem... [15] ... facilmente se ensina o que devem fazer para medirem com exacção [exatidão].

Também deve levar consigo uma régua de duas braças, ou vinte palmos, grossa a proporção do comprimento, e que se possa dobrar em quatro partes (para ficar mais portátil) por meio de umas machas-femeas desencontradas, e suas aldravinhas; para que fique tão firme quando se abrir, como se fosse inteiriça.

Se for grande a distancia, que se houver de medir, e também para as Cartas Geográficas, será necessário que leve uma cadeia de ferro delgada de 5.8. ou 10. Braças, e que esta cadeia vá dividida em braças com uns finais, que podem ser um dos anéis de cadeia de cobre, ou de mesmo ferro, e de diferente feitio: digo de 5.8 ou 10. [16]... braças, porque são números mais fáceis de formar, e multiplicar; ao diante diremos com que advertências se hão de medir os terrenos com a cadeia, que também se pode suprir com um cordel de linho de mediana grossura, em bem poido, e encerado, para que não se encolha com a umidade, ou estenda com o calor.

A ultima graça de régua, cadeia, ou cordel deve ser dividida em palmos: usando-se do cordel, será bom que se ponha em um carretel, para se não embaraçar, e se ir medindo com ele com maior promptidão, e facilidade.

Será bom também, que leve consigo uma taboa delgada do feitio, e tamanho de meia folha de papel, para escrever e riscar no campo, principalmente quando depois de tomados os pontos principais [17] ... da Carta lhe for necessário configurar o terreno entre os tais pontos, como montes, vales, rios, etc.

Para as Cartas dos Bispados deste Reino é necessário que os Engenheiros além de duas, ou tres pessoas, que saibam medir, levem consigo mais gente, ou a tomem de lugar a lugar; porque em cada ponto de posição dos que se houverem de tomar, se deve mandar por um homem com uma bandeirola: as bandeirolas se fazem ordinariamente com meios piques, pondo na ponta um pedaço de papel, ou lenço branco, para o que é necessário ao menos levar seis meios piques, ou paus direitos, que façam o mesmo efeito.

Fazendo as Cartas dos Bispados Provinciais, ou costas marítimas, sucede dar em despovoado; e para não [18] ... não perder tempo, é necessário, que o Engenheiro, e a sua comitiva levem barracas, e tenham entre a sua bagagem uma cavalgadura para lhe conduzir o sustento.

Não é necessário advertir que hão de levar régua, compasso, lápis, tinteiro, e papel, porque todos sabem que estas coisas são precisas.


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Ficha técnica da Fonte
Autor: Manuel de Azevedo Fortes
Data: 1722.
Referência: ..
Acervo: Biblioteca Nacional de Portugal.
Transcrição: Carlos Antonio Pereira de Carvalho.
link principal no BiblioAtlas: Tratado do modo o mais facil, e o mais exacto de fazer as cartas geograficas