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Proêmio

De Atlas Digital da América Lusa

Proêmio

Geometria

Proemio Foi sua Majestade, que Deus guarde, servido, para um fim digno da proteção que concede as ciências, e da sua vastíssima compreensão mandar instituir nesta Corte a Academia Real da História Eclesiástica , e secular destes Reinos; e sem embargo da minha insuficiência, tive a honra de ser nomeado um dos Acadêmicos dela. Na distribuição, que se fez dos empregos, que deviam ter os Acadêmicos, me foram encarregados os pontos Geográficos da mesma História, e a fábrica dos mapas ou cartas Geográficas, afim de a geral do Reino e conquistas, como as particulares doas seus bispados e Prelasias.

Todos reconhecem a grande faciliadade, que dão as Cartas Geográficas para inteligência das histórias; e todos sabem que juntas as Cartas à narração compõem o feu mais nobre ornato: mas nem todos sreconhecem o grande trabalho e o largo tempo, de que se nescessita para fabrica delas; esta foi a razão que tive para declarar à Academia na Conferência de vinte e sete de Mayo de mil setecentos e vinte um (dia, em que me tocava dar conta dos mesus estudos) que me seria possível satisfazer a minha obrigação, sem que o trabalho se repetisse pelos Engenheiros mais capazes das Províncias: e para que a obra fosse uniforme, feita por um mesmo método, e debaixo de um mesmo ponto de, ou petipé; me obrigava a compor um Tratado do modo o mais fácil e o mais exato de fazer as Cartas Geográficas de qualquer Pais, com toda aquela exatidão que é possível fazerem-se com os instrumentos que até o presente se tem inventado para esse fim: não sei se prometi muito; sei que não trabalhei pouco para o desempenho da promessa; e todo o trabalho darei por bem empregado, como se consiga o fim pretendido.

Não me moveu para esta composição a vaidade de me emergir em Autor; mas fim a precida necessidade vendo que os Engenheiros, que me devem ajudar, não tem coisa alguma de que possam valer; por que não sei que haja quem até o presente escreve na língua Portuguesa sobre esta materia; e também não sei que haja neste Reino Carta algúa particular de nenhum dos seus Bispados: entre as Cartas gerais, que há do Reino, a que passa por melhor, e mais exata, é a de Pedro Teixeira, que se estampou em Madrid no ano de 1662. a qual (exceto as coisas marítimas, que se acham menos mal arrimadas) é tão defeituosa, e tão cheia de erros de posição, que para o intento presente é o mesmo que sem a não houvera.

Digo que me moveu a precisa necessidade, porque sei por experiencia que os que melhor sabem a teórica, e nunca fizeram Cartas, se acham bem embaraçados quando a querem praticar no terreno; e a maior parte dos Engenheiros deste Reino tem pouco exercício das operações da Geografia, e por consequência pouco uso dos instrumentos, de que precisamente hão de usar para fazer as Cartas Geográficas.

Este é o Tratado, que ofereci: nele poderão ver os Engenheiros e curiosos não só o que se acha escrito nos Autores Estrangeiros (que são pucos e escreveram de passagem) mas também o que a experiência me tem mostrado nestes últimos anos, que ocupei quase todos na prática de tirar plantas, e Cartas diferentes Praças, e territórios, e só esta pequena parte das minhas observações quero se me atribua; porque o mais é tirado do Padre Claudio Milliet Deschales, de Monf. Ozanaõ na sua Introdução às Matemáticas, do Engenheiro Francês moderno, e principalmente do único Autor, que achei escrevesse ex processo esta matéria, intitulado Methode de lever les plans. A este último Autor anônimo segui em muita parte, e não fiz escrúpulo de copiar aquilo, que me pareceu se não podia expor melhor. Não me pareceu fazer divisões, e sudivisões da matéria, de que trato; porque são práticas separadas, que têm entre si pouca, ou nenhuma conexão pra se poderem distribuir por ordem reduzidas a certas classes; assim todo este Tratado nos seus diferentes Capítulos é uma narração simples, e natural de tudo o que li nos sobresitos Autores, e do que observei praticando. Não quis sair do estilo ordinário, e familiar, porque me pareceu mais próprio para individuar com clareza ainda as mais miúdas circunstâncias, que podem deter, e embaraçar aos principiantes; e também porque o principal intento foi tratar esta matéria por um método tão fácil, tão claro, tão miúdo, e tão ciscunstanciado de observações, que por ele não só os Engenheiros, mas ainda quaisquer outras pessoas levemente noticiosas da Geometria prática pudessem fazer com exacção as Cartas Geográficas de qualquer País.

Bem vejo que os que sabem a teoria destas operações, dirão que sou demasiadamente miúdo, e que fio pouco dos leitores, a quem as miudezas, que escrevo, facilmente poderiam ocorrer: assim é, mas seria com muito maior trabalho, e tempo perdido; e estou certo que eles mesmos se quiserem reduzir as suas especulações à prática do terreno, me agradecerão as advertências.

Os que duvidarem ser o método, que sigo, o mais fácil, e o mais exato, façam a experiência, e vejam se lhes é possível fazer a Carta particular de qualquer País que seja por meio das latitudes, e longitudes dos seus lugares, que de légua a légua não dão diferença sensível; ou se acham maior exacção nas distâncias, resolvendo trigonometricamente os triângulos, que formam os raios visuais dos instrumentos: e logo se desenganarão, e em lugar de condenar este meu trabalho, o procurarão adiantar com novas observações, emendando por meio delas os meus defeitos.


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Ficha técnica da Fonte
Autor: Manuel de Azevedo Fortes
Data: 1722.
Referência: ..
Acervo: Biblioteca Nacional de Portugal.
Transcrição: Diogo Neves de Carvalho.
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