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Sistemas de Informação Geográfica em História (Apresentação)

De Cliomatica - Digital History
Tempo estimado de leitura deste artigo 15 minutos - por Tiago Gil


(Este verbete apresenta algumas noções preliminares. Se você já conhece os princípios, pode ir diretamente para o aprendizado dos sistemas)

O historiador britânico Ian Gregory[1] consagrou o termo HGIS para designar a utilização de sistemas de informação geográficas voltados para os estudos em história. Trata-se de acrescentar o “quando” às perguntas “o quê” e “onde”, que caracterizam o GIS não histórico. Vários trabalhos recentes têm salientado as vantagens, os desafios e os problemas de trabalhar o HGIS.[2] Entre um entusiasmo alucinante de alguns e o ceticismo de outros, podemos perceber algumas questões relevantes. O fato de certos problemas sociais não encontrarem respostas com o auxílio de mapas euclidianos não invalida a tentativa de responder aos problemas que efetivamente podem ser respondidos com o uso destes mapas.


Problemas agrários, como concentração fundiária, ou demográficos, como concentração urbana e migração, encontram nas análises baseadas no espaço euclidiano um bom auxílio. Mas há outras possibilidades, como o estudo de rotas de viajantes, de peregrinações, de remodelamento urbano, de intensidade comercial entre regiões que também podem obter boas respostas desta abordagem, tudo isso dentro de uma perspectiva de história baseada na problematização de objetos e fontes. Há outros problemas que afetam uma tentativa de geoprocessamento em história. A inclusão da variável “tempo” a um lugar no espaço não é tarefa fácil. Ou mesmo a inclusão da variável “espaço” a um lugar ou processo no tempo. Como disseram Gregory e Ell:


GIS originated in disciplines that use quantitative and scientific approaches in a data-rich environment. Historical geography is rarely data-rich; in fact, data are frequently incomplete and error-prone.


Em história, quase sempre trabalhamos com dados incompletos, fluidos, incertos e é preciso criar maneiras de representar isso na cartografia ou, no mínimo, alertar os leitores para a regularidade deste problema. Mas é possível fazer um pouco mais do que isso. Há formas, trabalhosas, de melhorar nosso desempenho no geoprocessamento em história. Vejamos alguns princípios que ajudam a orientar esse tipo de método:


1. É mais fácil achar todos os pontos (locais no passado) do que apenas um;


2. É fundamental ter erudição “toponímica” histórica;


3. É fundamental fazer cruzamentos de dados com múltiplas fontes;


4. É importante ter em mente que o trabalho nunca vai acabar.


Vejamos agora, em parte, cada uma destas afirmações.


É mais fácil achar todos os pontos (locais no passado) do que apenas um

Em primeiro lugar, apesar de não parecer, faz sentido pensar que é mais fácil achar todos os lugares do passado do que apenas um, uma vez que podemos localizar as coisas na relação que elas têm com as outras, na vizinhança delas. Se uma sesmaria, unidade agrária do período colonial, diz ficar na fronteira com outra, podemos não saber onde ficam as duas, mas já sabemos que são vizinhas. É o princípio exato do quebra-cabeça. Tendo apenas uma peça na mão, não tenho muita ideia de onde ela ficaria no conjunto da obra, mas tendo todas consigo montar completamente. É claro que nosso trabalho não tem a precisão de um quebra-cabeça, lembrando, antes, um vaso quebrado que deve ser restaurado, pela usar uma metáfora usada por Ian Gregory. Mas a dificuldade de saber o local de uma única peça é igual e, por isso, é preciso ter em conta a posição relativa dos lugares na hora de encontrá-los.


É fundamental ter erudição “toponímica” histórica

A segunda afirmação complementa a primeira. Podemos saber onde ficam os lugares na relação que eles têm entre si, ou quem é vizinho de quem, sem saber exatamente onde isso vai dar na superfície terrestre. Mas se temos erudição toponímica, se sabemos os nomes dos lugares no passado, já podemos encontrar algumas referências que vão permitir colocar o conjunto todo no espaço euclidiano. Muitas vezes isso é possível com o uso informações do presente, como a localização atual de certos locais, como edificações, ruas ou praças. Mas se para o mundo urbano isso é difícil, para o mundo rural é quase impossível. De qualquer forma, conhecer a região que vamos estudar no presente e buscar informações sobre os nomes destes lugares no passado pode ajudar muito no geoprocessamento em história.


É fundamental fazer cruzamentos de dados com múltiplas fonte

Para viabilizar isso tudo, é preciso cruzar todas estas informações de toponímia com as fontes históricas, não apenas mapas históricos, como muitos gostam de relacionar com a cartografia digital em história, mas igualmente com documentos textuais, dados de patrimônio histórico e registros arqueológicos. Para tanto, é recomendável criar um bom banco de dados que faça isso tudo dialogar de modo organizado e fácil de recuperar. Podemos inclusive fazer o banco de dados exportar as informações (em arquivos CSV, por exemplo) para que os programas de GIS possam criar os mapas.


É importante ter em mente que o trabalho nunca vai acabar

Por fim, é preciso ter clareza de que nunca acabaremos de montar este quebra-cabeça, ou o vaso quebrado de Gregory. Mas podemos ir testando peças e o simples estudo de localização deste passado pode ser importante na proposição de novos problemas e novos objetos, afastando completamente este trabalho da sua aparente relação com o positivismo. Por fim, seria importante retomar algumas das vantagens destacadas por Gregory no trabalho de HGIS. Para ele, poderíamos dividir os benefícios desta metodologia em três categorias: a organização das fontes, a facilidade para visualizar as fontes (no mapa) e os resultados advindos da análise destas fontes e a facilidade de fazer análises espacial com os dados (com recursos estatísticos, por exemplo). Ainda nos resta pensar como organizar uma pesquisa em história com os olhos voltados para o espaço. Já temos algumas dicas, os nossos “princípios” acima expostos, Primeiros passos no geoprocessamento em história.


Referências

  1. GREGORY, I.N., and P.S. ELL. 2007. Historical GIS: Technologies, Methodologies, and Scholarship. Cambridge Studies in Historical Geography. Cambridge University
  2. VALENCIA, Carlos & GIL, Tiago. O Retorno dos Mapas. Porto Alegre: Ladeira Livros, 2016



Citação deste verbete
Como citar: GIL, Tiago. "Sistemas de Informação Geográfica em História (Apresentação)". In: CLIOMATICA - Portal de História Digital e Pesquisa. Disponível em: http://lhs.unb.br/cliomatica/index.php/Sistemas_de_Informa%C3%A7%C3%A3o_Geogr%C3%A1fica_em_Hist%C3%B3ria_(Apresenta%C3%A7%C3%A3o). Data de acesso: 30 de setembro de 2024.






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