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Freguesia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande

De Atlas Digital da América Lusa

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A freguesia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande foi uma freguesia rural do entorno da cidade do Rio de Janeiro que destacou-se, assim como outras nas imediações ou ao redor da Baía de Guanabara, na produção de açúcar. Elevada à condição de paróquia em 1673, contou com uma igreja matriz que foi seguidamente criticada por diversas visitas paroquiais no decorrer do século XVIII pela sua ruína e falta de compromisso dos fregueses na sua manutenção. Com a necessidade de se elevar um novo edifício para a matriz ainda no final do setecentos o visitador monsenhor Pizarro assinalava a dificuldade em levar adiante tal trabalho, pois restavam ainda desentendimentos e disputas quanto ao melhor lugar para a sua construção.<ref>ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 89-90</ref> O espaço de jurisdição paroquial alargava-se para além do atual bairro de Campo Grande, situando-se segundo monsenhor Pizarro entre os seguintes limites:
 
A freguesia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande foi uma freguesia rural do entorno da cidade do Rio de Janeiro que destacou-se, assim como outras nas imediações ou ao redor da Baía de Guanabara, na produção de açúcar. Elevada à condição de paróquia em 1673, contou com uma igreja matriz que foi seguidamente criticada por diversas visitas paroquiais no decorrer do século XVIII pela sua ruína e falta de compromisso dos fregueses na sua manutenção. Com a necessidade de se elevar um novo edifício para a matriz ainda no final do setecentos o visitador monsenhor Pizarro assinalava a dificuldade em levar adiante tal trabalho, pois restavam ainda desentendimentos e disputas quanto ao melhor lugar para a sua construção.<ref>ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 89-90</ref> O espaço de jurisdição paroquial alargava-se para além do atual bairro de Campo Grande, situando-se segundo monsenhor Pizarro entre os seguintes limites:
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|fonte=ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 92.
 
|fonte=ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 92.
 
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Ainda segundo Pizarro a freguesia surgiu a partir da capela do antigo engenho do Bangu, construída por Manoel de Barcelos Domingues, um dos primeiros a povoar a região a partirda fundação da cidade do Rio de Janeiro.<ref>ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro. Memórias Históricas do Rio de Janeiro e das Províncias Anexas à Jurisdição do Vice-Rei do Estado do Brasil. Tomo III. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1820, p. 231-232</ref>
 
Ainda segundo Pizarro a freguesia surgiu a partir da capela do antigo engenho do Bangu, construída por Manoel de Barcelos Domingues, um dos primeiros a povoar a região a partirda fundação da cidade do Rio de Janeiro.<ref>ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro. Memórias Históricas do Rio de Janeiro e das Províncias Anexas à Jurisdição do Vice-Rei do Estado do Brasil. Tomo III. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1820, p. 231-232</ref>
 
== Ocupação, Economia e População ==
 
 
Apesar de provavelmente encontrar ocupação portuguesa ainda no século XVI através do sistema de sesmarias, foi no século seguinte que a região apresentouum maior crescimento demográfico e consequentemente de maior ocupação do território. O motor deste processo foi a instauração de fazendas e engenhos de açúcar, que representou um movimento crescente em todo o século XVII. Segundo o levantamento realizado por Maurício de Almeida Abreu entre 1600 até 1700 a região de Campo Grande e sua vizinha Guaratiba passaram de um para onze engenhos em atividade.<ref>ABREU, Maurício de Almeida. Geografia Histórica do Rio de Janeiro 1502 – 1700, vol. 2. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio Editorial; Prefeitura do Município do Rio de Janeiro, 2010, p. 94</ref> A região apresentava atratividades para a plantação da cana de açúcar, especialmente algumas áreas que contavam com terrenos argilosos propícios para o cultivo da cana, incluindo ainda solos de barro vermelho que eram utilizados para a fabricação de tijolos, telhas e demais objetos de barro.<ref>FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Rumo ao Campo Grande: por trilhas e caminhos. Rio de Janeiro: [s.n.], 2004, p. 157</ref> Além disso, a estrada que ligava o centro ubano colonial do Rio de Janeiro com a fazenda de Santa Cruz cortava a freguesia de Campo Grande, facilitando o deslocamento para as fazendas do local e propiciando mais um meio de escoar a produção agrária da paróquia para além dos tradicionais caminhos que ligavam a região com o porto de Irajá.<ref>FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Idem, p. 39.</ref>
 
 
Apesar da crescente ocupação, as informações de teor demográfico da freguesia são escassas, restando alguns dados para o final do século XVII e do século XVIII. Em 1687 Campo Grande contava com 70 fogos (domicílios) com 313 pessoas de comunhão segundo uma antiga visita paroquial . Mais informações surgem no final do século XVIII com a visita de monsenhor Pizarro em 1794, quando ele asseverou 314 domicílios com 3.243 pessoas . A composição de africanos e mestiços escravizados certamente foi importante para esse crescimento populacional, porém só em uma relação de 1797 feita por Sebastião José Guerreiro da França por ordem do vice-rei Conde de Resende que surgem informações distinguindo a população livre da escravizada. Eram  na época 1.549 pessoas maiores e menores livres para uma população de 1.854 escravizadas, portanto mais da metade da população paroquial naquele final de século.
 
 
A plantação da cana e o fábrico do açúcar dominaram as atividades econômicas, porém surgiram outras atividades como a plantação da mandioca e a confecção da sua farinha, assim como a plantação do arroz, do feijão e do milho. Em 1779 foi apresentado para o vice rei Marquês de Lavradio uma relação com alguns dados produtivos da paróquia, que contava então com 10 engenhos de açúcar produzindo 174 caixas, 96,5 pipas de aguardente e 2.500 alqueires de farinha. Em 1797 a relação de Sebastião José Guerreiro demonstra 15 engenhos de açúcar com uma produção de 20.391 arrobas de açúcar, 207 de café, 368 alqueires de farinha, 215 de feijão, 148 de milho e 104 de arroz  . Ainda segundo a mesma relação, nas terras de todo o distrito miliciano de Guaratiba, do qual a paróquia de Campo Grande fazia parte, não existiam terras devolutas, sendo que o autor da relação faz a ressalva de que “nas grandes fazendas se conservam ainda algumas terras incultas para conservarem matos virgens donde possam tirar as madeiras necessárias para as suas fábricas.” .No final do século XVIII já devia existir uma grande pressão dos engenhos e fazendas, especialmente das maiores, sobre o domínio das terras no local, desaconselhando qualquer ocupação sem o aval de um senhorio da região. As tabelas populacionais elaboradas para Campo Grande pelo mesmo Sebastião José Guerreiroda França demonstram que boa parte das famílias viviam em condições de dependência: de um total de 355 famílias residentes na paróquia, 274 viviam como partidistas (moravam em terras de engenho produzindo canas)ou como foreiros em terras de outros senhores.
 
 
 
 
[[Arquivo:Thomas ender aljube.jpg|left|Ilustração de Thomas Ender, 1817]]
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
  
  
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[[Arquivo:Freguesia_rio.png|600px|right|thumb|Igreja matriz de N. S. do Desterro de Campo Grande em desenho de Maria Graham de cerca de 1823<ref>GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada nesse país durante parte dos anos de 1821, 1822 e 1823. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1956</ref>]]
  
  
  
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== Ocupação, Economia e População ==
  
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Apesar de provavelmente encontrar ocupação portuguesa ainda no século XVI através do sistema de sesmarias, foi no século seguinte que a região apresentouum maior crescimento demográfico e consequentemente de maior ocupação do território. O motor deste processo foi a instauração de fazendas e engenhos de açúcar, que representou um movimento crescente em todo o século XVII. Segundo o levantamento realizado por Maurício de Almeida Abreu entre 1600 até 1700 a região de Campo Grande e sua vizinha Guaratiba passaram de um para onze engenhos em atividade.<ref>ABREU, Maurício de Almeida. Geografia Histórica do Rio de Janeiro 1502 – 1700, vol. 2. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio Editorial; Prefeitura do Município do Rio de Janeiro, 2010, p. 94</ref> A região apresentava atratividades para a plantação da cana de açúcar, especialmente algumas áreas que contavam com terrenos argilosos propícios para o cultivo da cana, incluindo ainda solos de barro vermelho que eram utilizados para a fabricação de tijolos, telhas e demais objetos de barro.<ref>FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Rumo ao Campo Grande: por trilhas e caminhos. Rio de Janeiro: [s.n.], 2004, p. 157</ref> Além disso, a estrada que ligava o centro ubano colonial do Rio de Janeiro com a fazenda de Santa Cruz cortava a freguesia de Campo Grande, facilitando o deslocamento para as fazendas do local e propiciando mais um meio de escoar a produção agrária da paróquia para além dos tradicionais caminhos que ligavam a região com o porto de Irajá.<ref>FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Idem, p. 39.</ref>
  
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Apesar da crescente ocupação, as informações de teor demográfico da freguesia são escassas, restando alguns dados para o final do século XVII e do século XVIII. Em 1687 Campo Grande contava com 70 fogos (domicílios) com 313 pessoas de comunhão segundo uma antiga visita paroquial.<ref>Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro. Notícias do Bispado do Rio de Janeiro no ano de 1687. VP-38</ref> Mais informações surgem no final do século XVIII com a visita de monsenhor Pizarro em 1794, quando ele asseverou 314 domicílios com 3.243 pessoas.<ref>ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I</ref> A composição de africanos e mestiços escravizados certamente foi importante para esse crescimento populacional, porém só em uma relação de 1797 feita por Sebastião José Guerreiro da França por ordem do vice-rei Conde de Resende que surgem informações distinguindo a população livre da escravizada. Eram  na época 1.549 pessoas maiores e menores livres para uma população de 1.854 escravizadas, portanto mais da metade da população paroquial naquele final de século.<ref>Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o distrito de Guaratiba, de autoria de Sebastião José Guerreiro da Franca, assinalando as divisas do dito distrito com os de Irajá, São João Marcos e Ilha Grande. 1797</ref>
  
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A plantação da cana e o fábrico do açúcar dominaram as atividades econômicas, porém surgiram outras atividades como a plantação da mandioca e a confecção da sua farinha, assim como a plantação do arroz, do feijão e do milho. Em 1779 foi apresentado para o vice rei Marquês de Lavradio uma relação com alguns dados produtivos da paróquia, que contava então com 10 engenhos de açúcar produzindo 174 caixas, 96,5 pipas de aguardente e 2.500 alqueires de farinha.<ref>Relação do Marquês de Lavradio, parte II. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Tomo LXXVI, parte I, 1913, p. 289-360</ref> Em 1797 a relação de Sebastião José Guerreiro demonstra 15 engenhos de açúcar com uma produção de 20.391 arrobas de açúcar, 207 de café, 368 alqueires de farinha, 215 de feijão, 148 de milho e 104 de arroz.<ref>Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o...op cite. 1797. Apesar do autor afirmar que a quantidade de alqueire de farinha produzida foi de 368, os mapas populacionais e econômicos elaborados pelo mesmo para a freguesia de Campo Grande apresenta um total de 7.329 alqueires produzidos, valor mais compatível com a produção do mesmo gênero pouco antes em 1779. Talvez os 368 alqueires sejam somente a produção de farinhas dos engenhos e não da população total da paróquia. Ver Arquivo Histórico Ultramarino. MAPAS descritivos da população das freguesias de Campo Grande, Jacarepaguá, Guaratiba, Marapicú, Jacutinga, Aguaçú e Taguaí do distrito de Guaratiba, capitania do Rio de Janeiro, feitos por ordem do vice-rei do Estado do Brasil, conde de Resende [1797]. AHU-Rio de Janeiro, Caixa 165, Doc. 62. AHU_ACL_CU_017, Cx. 163, D. 12203.</ref> Ainda segundo a mesma relação, nas terras de todo o distrito miliciano de Guaratiba, do qual a paróquia de Campo Grande fazia parte, não existiam terras devolutas, sendo que o autor da relação faz a ressalva de que “nas grandes fazendas se conservam ainda algumas terras incultas para conservarem matos virgens donde possam tirar as madeiras necessárias para as suas fábricas.”.<ref>Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o...op cite. 1797.</ref> No final do século XVIII já devia existir uma grande pressão dos engenhos e fazendas, especialmente das maiores, sobre o domínio das terras no local, desaconselhando qualquer ocupação sem o aval de um senhorio da região. As tabelas populacionais elaboradas para Campo Grande pelo mesmo Sebastião José Guerreiroda França demonstram que boa parte das famílias viviam em condições de dependência: de um total de 355 famílias residentes na paróquia, 274 viviam como partidistas (moravam em terras de engenho produzindo canas)ou como foreiros em terras de outros senhores.
  
  
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Ilustração 1: Thomas Ender, 1817 <ref>http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AThomas_ender_aljube.jpg </ref>
 
 
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Edição atual tal como 14h00min de 25 de outubro de 2016

por Victor Luiz Alvares Oliveira


A freguesia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande foi uma freguesia rural do entorno da cidade do Rio de Janeiro que destacou-se, assim como outras nas imediações ou ao redor da Baía de Guanabara, na produção de açúcar. Elevada à condição de paróquia em 1673, contou com uma igreja matriz que foi seguidamente criticada por diversas visitas paroquiais no decorrer do século XVIII pela sua ruína e falta de compromisso dos fregueses na sua manutenção. Com a necessidade de se elevar um novo edifício para a matriz ainda no final do setecentos o visitador monsenhor Pizarro assinalava a dificuldade em levar adiante tal trabalho, pois restavam ainda desentendimentos e disputas quanto ao melhor lugar para a sua construção.[1] O espaço de jurisdição paroquial alargava-se para além do atual bairro de Campo Grande, situando-se segundo monsenhor Pizarro entre os seguintes limites:

Aspa1.png Divide-se esta Paroquia com a de S. João Batista de Meriti pelo N., em longitude de ¼ de légua: com a de N. S. Da Apresentação de Irajá pelo Nascente, em ½ légua: com a de N. S. do Loreto de Jacarepaguá pelo S. té as Serras do Rio Grande, e Mahitaráca: com a de S. Salvador do Mundo da Guaratiba pelo Poente , em 3 ½ léguas: e últimamente com a de N. S. da Conceição de Marapicu pelo rumo de W. Em 3 léguas Aspa2.png
ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 92.

Ainda segundo Pizarro a freguesia surgiu a partir da capela do antigo engenho do Bangu, construída por Manoel de Barcelos Domingues, um dos primeiros a povoar a região a partirda fundação da cidade do Rio de Janeiro.[2]


Igreja matriz de N. S. do Desterro de Campo Grande em desenho de Maria Graham de cerca de 1823[3]


Ocupação, Economia e População

Apesar de provavelmente encontrar ocupação portuguesa ainda no século XVI através do sistema de sesmarias, foi no século seguinte que a região apresentouum maior crescimento demográfico e consequentemente de maior ocupação do território. O motor deste processo foi a instauração de fazendas e engenhos de açúcar, que representou um movimento crescente em todo o século XVII. Segundo o levantamento realizado por Maurício de Almeida Abreu entre 1600 até 1700 a região de Campo Grande e sua vizinha Guaratiba passaram de um para onze engenhos em atividade.[4] A região apresentava atratividades para a plantação da cana de açúcar, especialmente algumas áreas que contavam com terrenos argilosos propícios para o cultivo da cana, incluindo ainda solos de barro vermelho que eram utilizados para a fabricação de tijolos, telhas e demais objetos de barro.[5] Além disso, a estrada que ligava o centro ubano colonial do Rio de Janeiro com a fazenda de Santa Cruz cortava a freguesia de Campo Grande, facilitando o deslocamento para as fazendas do local e propiciando mais um meio de escoar a produção agrária da paróquia para além dos tradicionais caminhos que ligavam a região com o porto de Irajá.[6]

Apesar da crescente ocupação, as informações de teor demográfico da freguesia são escassas, restando alguns dados para o final do século XVII e do século XVIII. Em 1687 Campo Grande contava com 70 fogos (domicílios) com 313 pessoas de comunhão segundo uma antiga visita paroquial.[7] Mais informações surgem no final do século XVIII com a visita de monsenhor Pizarro em 1794, quando ele asseverou 314 domicílios com 3.243 pessoas.[8] A composição de africanos e mestiços escravizados certamente foi importante para esse crescimento populacional, porém só em uma relação de 1797 feita por Sebastião José Guerreiro da França por ordem do vice-rei Conde de Resende que surgem informações distinguindo a população livre da escravizada. Eram na época 1.549 pessoas maiores e menores livres para uma população de 1.854 escravizadas, portanto mais da metade da população paroquial naquele final de século.[9]

A plantação da cana e o fábrico do açúcar dominaram as atividades econômicas, porém surgiram outras atividades como a plantação da mandioca e a confecção da sua farinha, assim como a plantação do arroz, do feijão e do milho. Em 1779 foi apresentado para o vice rei Marquês de Lavradio uma relação com alguns dados produtivos da paróquia, que contava então com 10 engenhos de açúcar produzindo 174 caixas, 96,5 pipas de aguardente e 2.500 alqueires de farinha.[10] Em 1797 a relação de Sebastião José Guerreiro demonstra 15 engenhos de açúcar com uma produção de 20.391 arrobas de açúcar, 207 de café, 368 alqueires de farinha, 215 de feijão, 148 de milho e 104 de arroz.[11] Ainda segundo a mesma relação, nas terras de todo o distrito miliciano de Guaratiba, do qual a paróquia de Campo Grande fazia parte, não existiam terras devolutas, sendo que o autor da relação faz a ressalva de que “nas grandes fazendas se conservam ainda algumas terras incultas para conservarem matos virgens donde possam tirar as madeiras necessárias para as suas fábricas.”.[12] No final do século XVIII já devia existir uma grande pressão dos engenhos e fazendas, especialmente das maiores, sobre o domínio das terras no local, desaconselhando qualquer ocupação sem o aval de um senhorio da região. As tabelas populacionais elaboradas para Campo Grande pelo mesmo Sebastião José Guerreiroda França demonstram que boa parte das famílias viviam em condições de dependência: de um total de 355 famílias residentes na paróquia, 274 viviam como partidistas (moravam em terras de engenho produzindo canas)ou como foreiros em terras de outros senhores.


[editar] Referências

  1. ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I, p. 89-90
  2. ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro. Memórias Históricas do Rio de Janeiro e das Províncias Anexas à Jurisdição do Vice-Rei do Estado do Brasil. Tomo III. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1820, p. 231-232
  3. GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada nesse país durante parte dos anos de 1821, 1822 e 1823. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1956
  4. ABREU, Maurício de Almeida. Geografia Histórica do Rio de Janeiro 1502 – 1700, vol. 2. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio Editorial; Prefeitura do Município do Rio de Janeiro, 2010, p. 94
  5. FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Rumo ao Campo Grande: por trilhas e caminhos. Rio de Janeiro: [s.n.], 2004, p. 157
  6. FRÓES, José Nazareth de Souza; GELABERT, Odaléa Ranauro Ensenat. Idem, p. 39.
  7. Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro. Notícias do Bispado do Rio de Janeiro no ano de 1687. VP-38
  8. ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e. O Rio de Janeiro nas Visitas Pastorais de Monsenhor Pizarro: inventário de arte sacra fluminense. (Concepção e coordenação de Marcus Antonio Monteiro Nogueira). Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. Vol. I
  9. Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o distrito de Guaratiba, de autoria de Sebastião José Guerreiro da Franca, assinalando as divisas do dito distrito com os de Irajá, São João Marcos e Ilha Grande. 1797
  10. Relação do Marquês de Lavradio, parte II. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Tomo LXXVI, parte I, 1913, p. 289-360
  11. Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o...op cite. 1797. Apesar do autor afirmar que a quantidade de alqueire de farinha produzida foi de 368, os mapas populacionais e econômicos elaborados pelo mesmo para a freguesia de Campo Grande apresenta um total de 7.329 alqueires produzidos, valor mais compatível com a produção do mesmo gênero pouco antes em 1779. Talvez os 368 alqueires sejam somente a produção de farinhas dos engenhos e não da população total da paróquia. Ver Arquivo Histórico Ultramarino. MAPAS descritivos da população das freguesias de Campo Grande, Jacarepaguá, Guaratiba, Marapicú, Jacutinga, Aguaçú e Taguaí do distrito de Guaratiba, capitania do Rio de Janeiro, feitos por ordem do vice-rei do Estado do Brasil, conde de Resende [1797]. AHU-Rio de Janeiro, Caixa 165, Doc. 62. AHU_ACL_CU_017, Cx. 163, D. 12203.
  12. Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros, IEB-USP. Fundo Alberto Lamego, AL-022-002, RELATO descrevendo o...op cite. 1797.



Citação deste verbete
Autor do verbete: Victor Luiz Alvares Oliveira
Como citar: OLIVEIRA, Victor Luiz Alvares. "Freguesia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande". In: BiblioAtlas - Biblioteca de Referências do Atlas Digital da América Lusa. Disponível em: http://lhs.unb.br/atlas/Freguesia_de_Nossa_Senhora_do_Desterro_de_Campo_Grande. Data de acesso: 28 de março de 2024.



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