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Livro 2 - DA HISTÓRIA DO BRASIL NO TEMPO DO SEU DESCOBRIMENTO - Capítulo 12 - Do que aconteceu na capitania de Itamaracá depois que dela se foi o donatário Pero Lopes de Souza

De Atlas Digital da América Lusa

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Livro 2 - DA HISTÓRIA DO BRASIL NO TEMPO DO SEU DESCOBRIMENTO - Capítulo 12 - Do que aconteceu na capitania de Itamaracá depois que dela se foi o donatário Pero Lopes de Souza

Geometria

Como o capitão Francisco de Braga sabia falar a língua do gentio, e era tão conhecido entre eles, não faziam senão o que ele queria, e lhes mandava, e assim se ia esta capitania povoando com muita facilidade, mas chegou neste tempo Duarte Coelho a povoar a sua, e como fez a povoação nos marcos, foi a muita vizinhança causa de terem algumas diferenças, por fim das quais lhe mandou Duarte Coelho dar uma cutilada pelo rosto, e o capitão vendo que não podia vingar, se embarcou para as Índias de Castela, levando tudo o que pôde; pelo que ficou a capitania desbaratada, perdida, como corpo sem cabeça, e muito mais por chegar neste tempo novas que eramorto Pero Lopes de Souza, vindo da Índia, onde el-rei o mandou por capitão-mor das naus. Mas sua mulher d. Isabel de Gamboa mandou logo aprestar um patacho em que viesse o capitão João Gonçalves, que já havia estado com seu marido, e se partisse à pressa, sem esperar por outros três navios, que se ficavam negociando; e assim se partiu; porém os que partiram derradeiro chegaram, e o primeiro arribou às Antilhas, e foi dar à costa na ilha de Santo Domingo, com os mastros quebrados, posto que se salvou a gente.

Vendo Pedro Vogado, que assim se chamava o capitão-mor dos três navios, que não era chegado o capitão João Gonçalves à ilha, os carregou logo de pau-brasil, e os tornou a mandar, avisando a d. Isabel do que passava, e de como ele ficava entretanto governando. A qual, em vez de

o mandar continuar porque o fazia mui honradamente, mandou outro capitão, que mais era para governar uma barca, e assim se embarcou, e foi por essas capitanias abaixo / como fez o Braga /, deixando esta em termos de se acabar de despovoar, se não fora um morador honrado chamado Miguel Álvares de Paiva, o qual levantaram por capitão, porque nunca se quis sair da ilha, antes teve mão nos outros, que se não fossem nem mandassem suas mulheres, e filhos, como alguns queriam, com medo dos gentios, que neste tempo tinham cercada a vila de Iguaraçu, e os ameaçavam que lhes haviam de fazer o mesmo; este capitão era o que socorria os do cerco com os barcos do mantimento, como dissemos no capítulo nono, e trazia outros entre a ilha e a terra firme com soldados e armas, para que estorvassem ao inimigo a passagem, até que finalmente se quietaram, e chegou o capitão João Gonçalves das Antilhas, cuja vinda foi muito festejada, e os gentios lhe tinham muito respeito, por verem que assim lho tinha Pero Lopes de Souza, quando cá esteve, e assim não lhe chamavam senão o capitão velho, e pai de Pero Lopes: e na verdade ele o parecia no zelo com que o servia, e procurava o aumento desta sua capitania, não consentindo que aos Índios se fizesse algum agravo, mas cariciando a todos, com que eles andavam tão contentes, e domésticos, que de sua livre vontade se ofereciam a servir os brancos, e lhes cultivavam as terras de graça, ou por pouco mais de nada, principalmente um ano que houve de muita fome na Paraíba, donde só pelo comer se vinham meter por suas casas a servi-los; e assim não havia branco, por pobre que fosse nesta capitania, que não tivesse 20 ou 30 negros destes, de que se serviam como de cativos, e os ricos tinham aldeias inteiras.


Pois que direi dos resgates que faziam, donde por uma foice, por uma faca, ou um pente traziam cargas de galinhas, bugios, Papagaios, mel, cera, fio de algodão, e quanto os pobres tinham. Durou esta era, a que ainda hoje os moradores antigos chamam dourada, enquanto viveu o capitão velho, mas depois que morreu vieram outros a destruir quanto estava feito, fazendo, e consentindo fazerem-se tantas vexações e agravos aos pobres gentios em suas próprias terras, e aldeias, que se começaram a inquietar e rebelar, e os que pela nossa paz e amizade se afastavam dos franceses, e senão eram alguns da beira mar, os outros do sertão de nenhuma maneira os admitiam entre si, nem queriam seu comércio; depois uns e outros se liaram com eles, e nos fizeram tão grandes guerras, quanto os moradores desta capitania o sentiram em suas pessoas e fazendas, e não menos o donatário, que todo este tempo recebeu dela perdas sem proveito, e enfim lhe veio a custar tomar-lhe el-rei um grande pedaço dela, que é grande parte da Paraíba, por havê-la conquistado, e libertado do poder dos inimigos à custa da sua fazenda, e de seus vassalos, como no livro quarto veremos.


Ficha técnica da Fonte
Autor: Frei Vicente do Salvador
Data: 1627.
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