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Livro 4 - DA HISTORIA DO BRASIL DO TEMPO QUE O GOVERNOU Manuel Teles Barreto ATÉ A VINDA DO GOVERNADOR Gaspar de Souza - Capítulo 15 - De como destruída a Copaíba foram ao Tujucupapo

De Atlas Digital da América Lusa

Edição feita às 08h53min de 9 de janeiro de 2013 por Tiagogil (disc | contribs)

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Livro 4 - DA HISTORIA DO BRASIL DO TEMPO QUE O GOVERNOU Manuel Teles Barreto ATÉ A VINDA DO GOVERNADOR Gaspar de Souza - Capítulo 15 - De como destruída a Copaíba foram ao Tujucupapo

Geometria

Daqui se partiram em busca do Tujucupapo, que o ano atrás lhe havia fugido, e caminhando dois dias, virando abaixo ao mar ao terceiro dia pela manhã deu a vanguarda em uma mui poderosa cerca, onde pela bandeira e tambor conheceram haver franceses com os Potiguares, do que logo avisaram ao ouvidor-geral, o qual quando chegou achou a bandeira do capitão João Tavares, que o fez aqui tão animosamente como sempre, porque à sua ilharga tinham morto três homens com piedosas feridas de pelouros de cadeia, que os tinham escalados, e contudo sempre sustentou a sua bandeira pegado à cerca em uma fronteira, na qual ele, e o sargento Diogo Arias, espantoso soldado que nesta jornada tinha recebido 14 flechadas, ganharam cada um sua seteira ou bombardeira aos inimigos, por onde umas vezes com as espadas, outras com os arcabuzes, os faziam despejar dali. O ouvidor, não obstando os grandes chuveiros, e nuvens de flechas, e pelouros, que dos inimigos nunca cessavam, tomando alguns consigo, que o quiseram seguir, e agachando-se como podiam, chegou à cerca pela banda de baixo, que por aquele confiados os inimigos na espessura do mato era mui fraca, e entulhada de terra e palma, e a começaram a desfazer, ainda que os inimigos logo ali acudiram de dentro com uma espingarda, e muita flecha, com que feriram o meirinho da alçada, a Heitor Fernandes, e outros; contudo Martim Leitão foi o primeiro que rompeu a cerca, cortando com a espada os cipós ou vimes com que estava liada, e fazendo buraco por onde se meteu, e posto que de boa entrada com um pau feitiço lhe feriram uma mão, de que lhe rebentou o sangue pelas unhas; à vista dele, como elefante indignado, se lançou dentro com Manuel da Costa, natural de Ponte de Lima, que o acompanhava, o que vendo os inimigos, derrubaram de duas ruins flechadas a Manuel da Costa, e com outras duas deitaram a carapuça de armas fora da cabeça ao ouvidor-geral, que só lhe ficou pendurada pelo rebuço de diante, e com muitas flechadas pregadas na adarga, pôs o joelho no chão para se desembaraçar das flechas, e cobrir a cabeça, ao que acudiu golpe de gentio para o tomarem às mãos, porque o não quiseram matar pelo conhecerem, e desejarem levá-lo vivo para testemunha de sua vitória, e triunfo, mas só o feriram a mão tente em uma coxa; ele vendo neste último transe da vida se levantou manquejando, mas furiosamente, e chegando-se a Manuel da Costa, seu amigo, para o defender, os fez afastar, por verem também a este tempo entrar já outros, dos quais o primeiro foi o alcaide de Pernambuco Bartolomeu Álvares, feitora do mesmo Martim Leitão, que bem lho pagou ali, e ajudou como mui valente, e esforçado soldado que era africano. O mesmo fizeram os mais, que entraram após ele com tanto valor e esforço que foram os inimigos despejando a cerca, sendo os franceses os primeiros: com o que gritando os nossos de dentro vitória, entraram os de fora, uns por uma parte, outros por outra, sem tratarem mais senão de se abraçarem uns aos outros com lágrimas de contentamento da mercê que lhe Deus fez, e não seguiram muito os inimigos, porque passada a fúria todos tinham que curar, e fazer consigo assaz, por ficarem quarenta e sete feridos, e três mortos do nosso arraial: do contrário também ficou morto algum gentio, que levavam às costas, como costumam, e o alferes francês, que na cerca ficou estirado com a sua bandeira e tambor, que se levaram para a Paraíba: porém apenas se começavam a curar os feridos, quando foi necessário deixá-los, por se ouvir uma grande grita, e alarido de Potiguares, que vieram de socorro a estoutros, e a virem mais cedo um pouco espaço não houvera remédio contra eles, os quais deram ainda em alguns da nossa retaguarda, mas vendo que eram fugidos os seus da cerca, e os nossos que dela vinham acudindo, também fugiram. Eram tantas, e tais as feridas, mormente de pelouros, que os franceses, que com os negros estavam na cerca, tiravam, que todo o restante do dia se gastou na cura dos feridos: na qual o ouvidor andou provendo com muita vigilância, e caridade, porque para tudo ia apercebido de botica, e por respeito deles, falta de pólvora, e outros inconvenientes que havia, se assentou queimassem o pau que ali se achou, voltassem por outro caminho o seguinte dia pela manhã, como fizeram com boa ordenança, buscando a Paraíba com assaz trabalho, guiados pelo sol, porque ninguém sabia aonde estava, e assim se agasalharam ao longo de um ribeiro pequeno aquela primeira noite da jornada como cada um pôde. No segundo dia de caminho marchando, em amanhecendo os salteou o gentio por duas partes a provar como iam, mas rebatendo-os fugiram com seu dano, e os nossos sem algum por suas jornadas chegaram à Paraíba, onde todos foram recebidos como mereciam.


Ficha técnica da Fonte
Autor: Frei Vicente do Salvador
Data: 1627.
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Acervo: .
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