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Livro 5 - DA HISTÓRIA DO BRASIL DO TEMPO QUE O GOVERNOU Gaspar de Souza ATÉ A VINDA DO GOVERNADOR DIOGO LUIZ DE OLIVEIRA - Capítulo 6 - De como o capitão Baltazar de Aragão saiu da Bahia com uma armada contra os franceses, e se perdeu

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Edição feita às 09h00min de 9 de janeiro de 2013 por Tiagogil (disc | contribs)

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Livro 5 - DA HISTÓRIA DO BRASIL DO TEMPO QUE O GOVERNOU Gaspar de Souza ATÉ A VINDA DO GOVERNADOR DIOGO LUIZ DE OLIVEIRA - Capítulo 6 - De como o capitão Baltazar de Aragão saiu da Bahia com uma armada contra os franceses, e se perdeu

Geometria

Recebendo Baltazar de Aragão a provisão de capitão-mor da guerra desta Bahia, junto com o aviso da vinda dos inimigo franceses, como dissemos no capítulo primeiro, logo começou a perceber e fortificar assim a cidade como a praia, cercando-as de suas cercas de pau a pique, com tanta diligência que a todo o instante trabalhava com os seus escravos, e criados sem ocupar a outros, senão era a oficiais de carpinteiros, e pedreiros, com que fez de pedra e cal o muro e portal da barda do Carmo, que até então era de terra de pilão, reformou e fortificou as portas, o que tudo pagou da sua bolsa, e até os paus para a cerca da praia mandou vir quase todos nas barcas dos seus engenhos; estando assim prestes aguardando os inimigos, soube que andavam na barra para a parte do morro de São Paulo seis naus francesas, e aprestando das portuguesas, que estavam à carga outras tantas, ele se embarcou em uma sua, que já tinha dentro 300 caixas de açúcar, levando consigo suas charamelas, baixela de prata, e as mais ricas alfaias de sua casa, porque determinava levar logo de lá a presa ao governador, que estava em Pernambuco. Das outras naus deu a melhor a Vasco de Brito Freire, que fez seu almirante, e as outras a Gonçalo Bezerra, e Bento de Araújo, que eram capitães de el-rei, e comiam seu soldo nesta cidade, e ao alferes Francisco do Amaral, e a outro chamado Queirós; no dia seguinte depois que partiram, e foi o do bem-aventurado Apóstolo S. Mathias, encontraram com os franceses, e pelejaram de parte a parte animosamente, e os nossos com muita vantagem, porque lhes tomaram uma nau, e lhes trataram a almeiranta tão mal, que ao outro dia seguinte se foi ao fundo, só a capitania quis Baltazar de Aragão poupar, não querendo que lhe tirassem senão abalroar com ela, e tomá-la Sá e inteira para a levar por troféu em seu triunfo, mas não sei se com este vento se com outro, que lhe deu nas velas, quando ia já para a ferrar pendeu tanto a sua nau, que tomou água pelas portinholas da artilharia, e calando-se pelas escotilhas, que iam abertas, foi entrando tanta, que em continenti se foi ao fundo com seu dono, o qual quando se fazia, dizem que dizia “Faço o meu ataúde”, e com ele se afogaram mais de 200 homens assim dentro na nau, como nadando no mar, donde não houve quem os tomasse, porque a Almeiranta se recolheu, e os mais com ele, podendo seguir a vitória com muita facilidade, e se alguns se salvaram foi nadando até às naus dos inimigos, que os tomaram, como foi Francisco Ferraz, filho do desembargador Baltazar Ferraz, que era sobrinho da mulher do Aragão, o qual depois deitaram os franceses em terra 60 léguas do Rio Grande para o Maranhão com outros dois ou três homens, onde de fome e cansaço do caminho morreu ao passar de um rio a pura míngua, sendo que tinha de patrimônio nesta Bahia mais de 50 mil cruzados, porque também seu pai morreu logo de desgosto; e publicamente se disse ser justo juízo de Deus por um caso exorbitante, que pouco antes havia acontecido, e foi o seguinte. Tinha Baltazar Ferraz aqui um sobrinho, o qual se enamorou de uma moça casada com um mancebo honrado, e chegou a tirar-lha de casa, e trazê-la de sua mão por onde queria, e finalmente mandá-la para Viana donde era natural; querelou dele o marido, diante do ouvidor-geral Pero de Cascais, que o prendeu valorosamente, e preso na cadeia se livrou até final sentença, trabalhando o tio tanto em desviar testemunhas, recusar a parte, e outras astúcias, que os desembargadores o julgaram por solto, e livre, e se os pregadores o estranhavam no púlpito, diziam que eram uns ignorantes, e que nunca outra mais justa sentença se dera no mundo, e assim não havia mais remédio que apelar para Nosso Senhor Jesus Cristo, o qual como reto juiz permitiu que o réu se embarcasse com o primo e parente, e todos acabassem desastradamente, e o tio que se não embarcou também com eles. Outro mancebo chamado Agostinho de Paredes foi a nado até a almeiranta dos inimigos, mas como estavam coléricos por lhe terem a nau tão maltratada, não o quiseram recolher, antes indo subindo o feriram com um pique em um ombro, de que depois de escapar do naufrágio, e dos tubarões, que o iam seguindo pelo sangue, nadando mais de uma légua para a terra, esteve a ponto de morte em mãos de cirurgiões, mas sarou, e viveu depois muitos anos.


Ficha técnica da Fonte
Autor: Frei Vicente do Salvador
Data: 1627.
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