A confecção de um banco de dados: um caso da Bahia do século XVI

De Cliomatica - Digital History
Tempo estimado de leitura deste artigo 17 minutos - por Carlos Antonio Pereira de Carvalho


Usarei o meu caso para exemplificar partindo desde a concepção, a criação/adaptação e por fim, os resultados. Vejamos a imagem que a seguir.

BancoDeDados.jpg

Imagem do Banco de dados


Eu gostaria que o leitor se atentasse para os campos que constituem esse banco de dados. Neste caso específico, o Banco conta com diversos campos que podem ser preenchidos de acordo com a disponibilidade da informação. Para o nosso objetivo, há campos que são mais essenciais do que outros, entretanto, nada nos impede de criarmos outras categorias que possam vir a ser úteis para a pesquisa. Para a explicação do nosso trabalho, irei me ater apenas nestes que são essenciais, os quais são: Fonte; Campo do testemunho; Interrogado; Mencionados; Locais citados; Pessoa 1; Local 1; Pessoa 2; Local 2; Pessoa_assunto; Local 3 e Intensidade. Esses campos foram fundamentais pois “quebravam” as interações (fofocas) em unidades, o que deu flexibilidade para a análise. Com essa fragmentação, era possível obter todas as conversas referidas a alguém ou com quem teria conversado ou, em outra abordagem, todas as conversas de escravizados, de seguidores de algum grupo ou de moradores de um bairro em particular. Vamos agora explicar minuciosamente cada campo deste citado, começando pelos sete últimos, que serão a chave para a construção do nosso objeto. Pessoa 1: Este campo diz respeito ao nome da pessoa que está testemunhando. Tal informação está sempre disponível nos depoimentos, é possível inferir que há uma obrigatoriedade em denominar a pessoa interrogada.

Local 1: Este campo refere-se ao local de moradia da pessoa 1, ou seja, o interrogado. Esta também é outra regularidade encontrada nas fontes, a testemunha se apresentava e dizia de onde era natural e em que local residia. Nos documentos analisados nesta pesquisa sempre apareceu de alguma forma o local de moradia ou a naturalidade da pessoa interrogada.

Pessoa 2: Já este campo refere-se à pessoa denunciada na fonte. Tal campo é específico para os documentos categorizados como "denunciações". Todas as fontes que se encaixam nessa categoria falam sobre a denúncia e a quem esta é dirigida. Geralmente o denunciado é assinalado no começo do documento, com um título de "contra fulano". Às vezes as denúncias não são feitas utilizando o nome da pessoa e sim por uma característica forte conhecida desta ou por uma alcunha. Outra utilização possível da Pessoa 2 é por meio de uma variação na intensidade. Quando trabalha-se com a intensidade 2, o campo deixa de ser sobre os dados da pessoa denunciada e torna-se os dados sobre a pessoa que passou as informações ao interrogado. Há diversos casos em que o interrogado denuncia uma pessoa por causa de conhecimentos obtidos por meio de uma conversa que teve com outro agente. Neste caso, o denunciante recebe uma informação indireta sobre um acontecimento, ou seja, aquela informação que está sendo repassada para o Santo Ofício veio de uma outra pessoa. Quando isso acontece, são catalogados os dados dessa segunda pessoa de forma que possamos saber por onde a informação está circulando. Local 2: Este campo é relativo ao local de moradia da pessoa 2, podendo ser do denunciado ou do interlocutor da denúncia. Na maioria dos casos esta informação está presente. Todavia, encontramos também documentos em que não foi possível localizar este dado. Pessoa_assunto: Este campo está diretamente ligado à Pessoa 2 e relaciona-se à pessoa que é denunciada no documento. Este campo só aparece quando há uma terceira pessoa envolvida na denúncia, desta forma a Pessoa assunto é obrigatoriamente o ser humano que está sendo denunciado.

Local 3: Este campo faz referência ao local de moradia da pessoa-assunto, ou seja, do agente denunciado que é tema de conversa entre o interrogado e outra. Quando (em meses): Esta informação se refere ao tempo em que o fato ocorreu. Geralmente este dado não vem de maneira uniforme e é quase sempre impreciso. Todavia, tentamos estabelecer uma mensuração que possa representar o dado obtido. Escolhemos representá-la em meses devido à facilidade em quantificar os dados diversos. Intensidade: O campo intensidade foi criado para aferir os níveis das informações faladas pelos depoentes. Estes níveis de informações estão separados em: Informação direta (Intensidade 1); informação indireta ou de segunda mão (Intensidade 2) e de "fama pública" (Intensidade 3) – tal definição é originária da própria documentação. As informações diretas consistem em informações de experiências do próprio interrogado. Estas informações indicam que o testemunhante viu ou participou do acontecimento que está denunciando. Não necessariamente participando como atuante da heresia relatada aos inquisidores, mas como alguém que viu o fato ocorrer. Seria este uma testemunha ocular.

Já a informação indireta ou de segunda mão consiste em informações que são repassadas por outro agente. Neste caso, o interrogado está denunciando algo sobre uma pessoa que ouviu da boca de terceiros. Nesse caso, a segunda pessoa quase sempre é especificada e citada na fonte. A informação representada por fama pública consiste em um conhecimento que teoricamente é compartilhado por todos sobre um relato. Este é um evento de conhecimento público daquela sociedade segundo os depoentes, ou seja, todos detém informações do fato citado na denúncia. Normalmente este evento vem sempre com a expressão é do conhecimento de todos ou ouvir dizer em fama pública.

Como explicitado, cada conceito deste presente no banco de dados refere-se a um campo de preenchimento que recolherá informações específicas do documento trabalhado. Ou seja, cada campo deste contém uma categoria de informações que será preenchida de acordo com os conceitos que criamos para esse preenchimento. Pessoa 1 dirá a respeito do nome da pessoa que está testemunhando o caso; Pessoa 2 tratará a respeito da pessoa que está sendo denunciada ou fora mencionada no testemunho e assim por diante. Dita essas informações, o nosso banco de dados já está pronto para colher informações de nosso interesse na fonte utilizada. Se o leitor se atentou, através destas poucas categorias de informações criadas, já podemos obter uma série de dados “automaticamente” do documento. Desta forma é possível organizar a fonte da maneira com a qual queremos utilizá-la. Ou seja, toda a informação dispersa - que poderia demandar um trabalho bem maior para compreender - agora está organizada em uma forma que consigo manejar da maneira que irá melhor me servir. Consigo isolar ou juntar dados de acordo com a minha necessidade de uma forma muito mais eficaz. Se pararmos para refletir sobre, o banco de dados nada mais é que um sistema. Ou seja, um conjunto de elementos interligados organizadamente, de modo que é possível compreender cada parte deste em um conjunto ou isoladamente. Neste sentido, o Banco de dados nos dá suporte para organizarmos a nossa fonte e manejarmos ela a favor do pesquisador.

Todavia, qual é a vantagem de trabalhar com um banco de dados?

Continua em Vantagens de se trabalhar com um banco de dados: um caso da Bahia do século XVI


Referências



Citação deste verbete
Como citar: CARVALHO, Carlos Antonio Pereira de. "A confecção de um banco de dados: um caso da Bahia do século XVI". In: CLIOMATICA - Portal de História Digital e Pesquisa. Disponível em: http://lhs.unb.br/cliomatica/index.php/A_confec%C3%A7%C3%A3o_de_um_banco_de_dados:_um_caso_da_Bahia_do_s%C3%A9culo_XVI. Data de acesso: 1 de junho de 2024.






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